Carlos XIV João da Suécia (m. 1844)
A história de Carlos XIV João, conhecido na Suécia como Karl XIV Johan e na Noruega como Karl III Johan, é uma das mais notáveis ascensões sociais e políticas da era moderna. Nascido Jean-Baptiste Jules Bernadotte em Pau, no sul da França, a 26 de janeiro de 1763, ele percorreria um caminho extraordinário de um sargento do exército francês a Marechal do Império sob Napoleão, e finalmente, ao trono de dois reinos escandinavos. Seu reinado, que se estendeu de 1818 até sua morte em 8 de março de 1844, não só marcou o início da duradoura dinastia Bernadotte, mas também inaugurou um período de paz e prosperidade para a Suécia e a Noruega, estabelecendo as bases para as relações internacionais da região por mais de um século.
De Soldado Revolucionário a Marechal do Império
A jornada de Bernadotte começou em 1780, quando ingressou no Exército Real Francês como soldado raso. A eclosão da Revolução Francesa em 1789 abriu caminho para homens de talento ascenderem independentemente de sua origem, e Bernadotte foi um exemplo perfeito. Sua notável capacidade militar e liderança em campo de batalha permitiram-lhe subir rapidamente na hierarquia, sendo promovido a general de brigada em 1794. Ele serviu com distinção em campanhas cruciais na Itália e na Alemanha, demonstrando não apenas bravura, mas também um intelecto tático apurado. Por um breve período, atuou como Ministro da Guerra, um testemunho de sua crescente influência e reconhecimento dentro da nova estrutura política francesa.
Apesar de um relacionamento muitas vezes descrito como turbulento e complexo com Napoleão Bonaparte — marcado por momentos de admiração mútua, rivalidade e desconfiança —, a genialidade militar de Bernadotte era inegável. Quando Napoleão proclamou o Primeiro Império Francês, ele o nomeou um dos primeiros Marechais do Império, a mais alta patente militar. Bernadotte desempenhou um papel crucial na decisiva vitória francesa na Batalha de Austerlitz em 1805, um triunfo que consolidou a hegemonia napoleônica na Europa. Como recompensa por seus serviços, ele foi agraciado com o título de Príncipe de Pontecorvo, um pequeno principado no sul da Itália, elevando-o à nobreza imperial. Curiosamente, seu casamento com Désirée Clary o tornou cunhado de Joseph Bonaparte, o que o inseriu ainda mais no círculo íntimo da família imperial estendida, uma conexão que, ironicamente, desempenharia um papel inesperado em seu futuro destino.
A Surpreendente Eleição para o Trono Sueco
O ano de 1810 trouxe um desenvolvimento verdadeiramente inesperado na vida de Bernadotte. A Suécia enfrentava uma crise dinástica profunda: o Rei Carlos XIII, já idoso e sem herdeiros diretos, precisava nomear um sucessor para garantir a estabilidade do reino. Em meio a um cenário político complexo e à busca por um candidato que pudesse proteger os interesses suecos contra as potências europeias da época, Bernadotte foi eleito herdeiro presuntivo (príncipe herdeiro). Essa escolha, aparentemente improvável para um general francês, foi em grande parte orquestrada e defendida por figuras como o barão Carl Otto Mörner, um cortesão sueco e membro influente do Riksdag dos Estados, que via em Bernadotte não apenas um líder militar competente, mas também alguém capaz de proteger a Suécia da Rússia e, ironicamente, da própria França de Napoleão. A reputação de Bernadotte de tratar bem os prisioneiros de guerra suecos também contribuiu para sua popularidade.
Ao chegar à Suécia, Jean Bernadotte adotou o nome de Carlos João e rapidamente assumiu as rédeas do governo. Foi nomeado regente e generalíssimo das Forças Armadas Suecas, tornando-se, de facto, o chefe de estado durante a maior parte do período em que foi príncipe herdeiro. Sua liderança foi decisiva na reorientação da política externa sueca, afastando-se da aliança forçada com a França de Napoleão e buscando uma nova posição estratégica na Europa.
Estratégia e Triunfo na Sexta Coalizão
A política de neutralidade sueca sob Carlos João foi posta à prova quando, em 1813, a França de Napoleão invadiu a Pomerânia sueca de forma não provocada. Este ato hostil catalisou a decisão de Carlos João de se aliar às potências anti-Napoleônicas. Ele foi fundamental na formação da Sexta Coalizão, utilizando sua experiência diplomática e militar para unir o czar Alexandre I da Rússia e a Grã-Bretanha numa aliança poderosa contra a França. Sua influência foi crucial para persuadir esses estados a trabalharem em conjunto, superando desconfianças históricas.
Mais do que um mero comandante, Carlos João foi o autor do Plano Trachenberg, a estratégia de campanha aliada que se provaria vencedora na guerra. Este plano astuto visava evitar confrontos diretos com o próprio Napoleão nos estágios iniciais, concentrando-se em derrotar seus marechais e enfraquecer progressivamente o exército francês. Ele comandou o Exército Aliado do Norte, que defendeu Berlim com sucesso contra duas tentativas francesas de captura e, no dia final da catastrófica derrota francesa em Leipzig (a "Batalha das Nações"), deu o ataque decisivo, selando o destino de Napoleão e de seu império.
A União Sueco-Norueguesa e um Reinado de Paz
Após o colapso do Império Napoleônico, Carlos João voltou sua atenção para a consolidação dos interesses suecos. Em 1814, ele forçou o Rei Frederico VI da Dinamarca, um aliado de Napoleão, a ceder a Noruega à Suécia pelo Tratado de Kiel. Embora a Noruega tenha resistido, declarando sua independência, a subsequente Guerra Sueco-Norueguesa de 1814 resultou na derrota norueguesa após um curto conflito de verão. Este evento levou à formação de uma união pessoal entre a Suécia e a Noruega, na qual ambos os reinos mantiveram suas próprias leis e instituições, mas compartilhavam um monarca. Esta união, um legado complexo da sua política externa, duraria quase um século, sendo dissolvida pacificamente em 1905, um testemunho da relativa estabilidade que ele ajudou a estabelecer na região. A Guerra Sueco-Norueguesa de 1814 é historicamente notável por ser considerada o último conflito direto e guerra em que a Suécia esteve envolvida.
Em 1818, com a morte de Carlos XIII, Carlos João ascendeu formalmente aos tronos da Suécia e da Noruega. Seu reinado foi caracterizado por um longo período de paz e prosperidade, permitindo que ambos os países se recuperassem das turbulências das guerras napoleônicas. Ele promoveu a modernização da economia, a construção de infraestruturas e a estabilidade social, consolidando a posição da nova dinastia Bernadotte. Faleceu em 8 de março de 1844, deixando um legado duradouro de um império militar francês a um monarca constitucional escandinavo, cujo impacto ainda é sentido na região até hoje.
Perguntas Frequentes (FAQs) sobre Carlos XIV João
- Quem foi Carlos XIV João?
- Carlos XIV João foi o primeiro monarca da dinastia Bernadotte, reinando como Rei da Suécia e Noruega de 1818 a 1844. Nascido Jean Bernadotte na França, ascendeu de soldado a Marechal de Napoleão antes de ser eleito príncipe herdeiro da Suécia.
- Como Jean Bernadotte se tornou Rei da Suécia e Noruega?
- Em 1810, sem herdeiro direto, o Rei Carlos XIII da Suécia precisava de um sucessor. Bernadotte foi inesperadamente eleito príncipe herdeiro devido à sua reputação militar e à necessidade sueca de um líder forte. Ele assumiu o nome de Carlos João e, após a morte de Carlos XIII em 1818, herdou os tronos da Suécia e Noruega.
- Qual foi o seu papel nas Guerras Napoleônicas?
- Bernadotte serviu como Marechal do Império sob Napoleão, distinguindo-se em batalhas como Austerlitz. Após se tornar príncipe herdeiro da Suécia, ele mudou de lado, liderando a Sexta Coalizão contra Napoleão, concebendo o Plano Trachenberg e comandando o Exército Aliado do Norte que foi decisivo na derrota francesa em Leipzig.
- Como surgiu a união entre a Suécia e a Noruega sob seu reinado?
- Após as Guerras Napoleônicas, Carlos João forçou a Dinamarca a ceder a Noruega à Suécia em 1814. Apesar da resistência norueguesa e de uma breve guerra, a Noruega foi incorporada a uma união pessoal com a Suécia, mantendo suas próprias leis, mas sob o mesmo monarca. Essa união durou até 1905.
- Qual o legado da dinastia Bernadotte?
- A dinastia Bernadotte, fundada por Carlos XIV João, continua a reinar na Suécia até os dias de hoje. Ele estabeleceu um período de paz e prosperidade na Escandinávia, afastando a região de grandes conflitos e estabelecendo as bases para o desenvolvimento moderno de ambos os países.