A história de John Bellingham (1769 – 18 de maio de 1812) entrelaça-se com um dos eventos mais dramáticos e singulares da história política britânica: o assassinato de Spencer Perceval, em 1812. Bellingham, um comerciante inglês, não só se tornou o autor deste ato sem precedentes mas também gravou Perceval na história como o único primeiro-ministro britânico a ser assassinado no cargo. Este episódio, carregado de desespero pessoal e reverberações políticas, oferece um vislumbre das tensões sociais e desafios enfrentados pela Grã-Bretanha no início do século XIX.

O Ato Chocante: Um Primeiro-Ministro Assassinado

Na tarde de 11 de maio de 1812, por volta das 17h15, o cenário político britânico foi abalado por um evento impensável. Spencer Perceval, que na época servia como Primeiro-Ministro do Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda, foi brutalmente alvejado no saguão da Câmara dos Comuns. O atirador era John Bellingham, um comerciante de Liverpool cuja vida tinha sido marcada por adversidades e uma profunda queixa contra o governo. A audácia do ato, cometido no coração da política britânica, deixou a nação em estado de choque e apreensão.

John Bellingham: O Homem por Trás do Gatilho

Para entender o motivo que levou Bellingham a um ato tão extremo, é preciso recuar alguns anos. John Bellingham era um comerciante com negócios na Rússia, onde foi detido e aprisionado devido a uma dívida comercial que ele alegava ser injusta. Após a sua libertação, ele buscou insistentemente compensação do governo britânico pelos danos e perdas sofridas, acreditando que as autoridades haviam falhado em protegê-lo e intervir em seu favor. No entanto, os seus apelos e petições foram consistentemente ignorados ou recusados, levando-o a um estado crescente de frustração e amargura. Ele via a negação de reparação como uma grave injustiça pessoal e uma falha moral por parte do Estado, culminando na trágica decisão de recorrer à violência para fazer valer o seu ponto.

Um Julgamento e Execução Sem Precedentes

A captura de Bellingham foi imediata e a sua sorte, selada com uma rapidez espantosa. Quatro dias após o assassinato de Perceval, ele foi levado a julgamento. Apesar de algumas questões levantadas sobre a sua sanidade mental – dadas a sua falta de remorso e a sua aparente convicção de que as suas ações eram plenamente justificadas – Bellingham foi declarado legalmente responsável pelos seus atos. O veredicto foi de culpado, e a sentença, a pena capital. Em 18 de maio, apenas uma semana após o assassinato e um mês antes do início da Guerra de 1812 com os Estados Unidos, John Bellingham foi enforcado na prisão de Newgate, selando um dos capítulos mais sombrios da história britânica.

O Contexto Político: As Guerras Napoleónicas e o Descontentamento Social

Spencer Perceval liderava o governo conservador desde 1809, num período de imensa turbulência para a Grã-Bretanha. A nação estava profundamente envolvida nas Guerras Napoleónicas, um conflito que exigia medidas drásticas e sacrifícios significativos. Perceval, conhecido pela sua determinação e rigor, implementou políticas severas para financiar a guerra e manter o bloqueio continental contra a França. Embora necessárias para o esforço de guerra, essas políticas, como os "Orders in Council" que restringiam o comércio, tiveram um custo humano considerável, causando pobreza generalizada e agitação social em muitas partes do país. A escassez de alimentos, o desemprego e as condições de vida precárias alimentaram um profundo ressentimento entre as classes trabalhadoras e os comerciantes afetados.

Reações Públicas e o Legado de Perceval

A notícia da morte de Spencer Perceval foi recebida de forma polarizada. Enquanto a elite política e grande parte da sociedade se horrorizavam com o assassinato, em algumas das regiões mais afetadas pela crise económica e pelas políticas de guerra, a notícia gerou até um sentimento de regozijo. Houve receios iniciais de que o assassinato pudesse ser o catalisador de uma revolta popular generalizada, mas rapidamente ficou claro que Bellingham havia agido sozinho, movido por uma queixa pessoal profunda e não por uma conspiração política mais ampla.

Paradoxalmente, apesar da sua liderança em tempos tão cruciais, o ministério de Perceval foi rapidamente esquecido após a sua morte. Muitas das suas políticas foram revertidas, e a sua figura acabou por ser mais lembrada pela maneira trágica como morreu do que pelas suas realizações políticas. Não foram erigidos grandes monumentos à sua memória, e ele permanece, até hoje, o único primeiro-ministro britânico a ter sido assassinado no cargo.

Perspetivas Históricas e a Teoria da Conspiração

A maneira apressada como o julgamento e a execução de John Bellingham foram conduzidos tem sido objeto de escrutínio e crítica por historiadores posteriores. Muitos argumentam que o processo foi contrário aos princípios da justiça, especialmente considerando as dúvidas levantadas sobre a sua sanidade e a velocidade com que tudo se desenrolou, talvez para evitar qualquer escalada de agitação social ou investigações mais profundas.

Mais recentemente, um estudo de 2012 reacendeu o debate ao levantar a possibilidade de que Bellingham não tenha agido sozinho. Esta investigação sugeriu que ele poderia ter feito parte de uma conspiração, agindo em nome de um consórcio de comerciantes de Liverpool que eram hostis às políticas económicas de Perceval e que se viam gravemente prejudicados por elas. Embora esta teoria não seja conclusiva, ela adiciona uma camada de complexidade e mistério a um evento já extraordinário, lembrando-nos que a história é frequentemente mais intrincada do que a superfície revela.

Perguntas Frequentes

Quem foi Spencer Perceval?

Spencer Perceval foi o Primeiro-Ministro do Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda de 1809 a 1812. Ele liderou o governo conservador durante um período crítico das Guerras Napoleónicas e é conhecido como o único primeiro-ministro britânico a ter sido assassinado no cargo.

Quem foi John Bellingham?

John Bellingham era um comerciante inglês, nascido em 1769, que se tornou o assassino de Spencer Perceval em 1812. Ele alegava ter uma profunda queixa contra o governo britânico por não o ter compensado por perdas sofridas e aprisionamento na Rússia.

Qual foi o motivo do assassinato de Spencer Perceval?

Bellingham assassinou Perceval como um ato de protesto e vingança pessoal. Ele acreditava que o governo havia falhado em compensá-lo por um tratamento injusto que ele recebeu na Rússia, onde foi preso por uma dívida comercial, e viu o primeiro-ministro como o principal responsável pela sua desgraça.

Por que o julgamento e a execução de Bellingham foram tão rápidos?

O julgamento e a execução de John Bellingham foram extraordinariamente rápidos, ocorrendo apenas uma semana após o assassinato. Essa pressa pode ter sido impulsionada pela necessidade de restaurar a ordem e a confiança pública rapidamente, além de reprimir qualquer possibilidade de instabilidade social ou levantes, embora muitos historiadores questionem a justiça do processo devido à sua celeridade.

Houve alguma conspiração por trás do assassinato?

Embora as investigações iniciais concluíssem que Bellingham agiu sozinho, uma teoria levantada por um estudo de 2012 sugere a possibilidade de que ele pudesse ter agido em nome de um consórcio de comerciantes de Liverpool que eram adversários das políticas económicas de Perceval. No entanto, esta teoria não é amplamente aceita como um fato comprovado.

Perceval foi o único primeiro-ministro britânico assassinado?

Sim, Spencer Perceval permanece, até hoje, o único primeiro-ministro britânico a ter sido assassinado enquanto estava no cargo. Isso torna seu assassinato um evento único e marcante na história política do Reino Unido.

Qual era a situação da Grã-Bretanha na época do assassinato?

Em 1812, a Grã-Bretanha estava no auge das Guerras Napoleónicas, enfrentando grandes desafios económicos e sociais. As políticas de guerra, incluindo bloqueios comerciais, causaram pobreza generalizada, desemprego e agitação em muitas partes do país, levando a um clima de descontentamento social.