A figura de Johannes Vares (12 de janeiro de 1890 [calendário juliano: 31 de dezembro de 1889] – 29 de novembro de 1946), mais conhecido pelo seu pseudónimo literário Johannes Vares Barbarus, é uma das mais complexas e controversas na história da Estónia do século XX. Poeta prolífico e médico de profissão, a sua trajetória política marcou indelevelmente o destino da nação báltica durante um dos seus períodos mais sombrios.
Primeiros Anos e Formação
Nascido na Paróquia de Kiisa, então parte do histórico Kreis Fellin (hoje englobado na Paróquia de Viljandi), Johannes Vares iniciou a sua educação formal no Ginásio de Pärnu. Posteriormente, dedicou-se ao estudo da medicina na prestigiada Universidade de Kiev, na atual Ucrânia. Esta formação inicial sublinharia a dualidade da sua vida: a ciência e a humanidade da medicina, por um lado, e a sensibilidade e expressão da poesia, por outro.
Serviço Militar e Transição Política
Durante a Primeira Guerra Mundial, Vares serviu como médico militar, uma experiência que o confrontou com a crueza do conflito. Com o advento da Guerra de Libertação da Estónia (1918-1920), fundamental para a consolidação da independência da jovem república, continuou a prestar serviço como médico militar no exército estoniano. Embora a sua participação lhe tenha valido a oferta da prestigiada Cruz da Liberdade da Estónia, um reconhecimento máximo de heroísmo, Vares surpreendentemente recusou a distinção. Este gesto já dava indícios das suas convicções políticas e sociais que se distanciavam do nacionalismo e do sistema estabelecido. Após a guerra, estabeleceu-se como médico em Pärnu, mas a sua paixão pela literatura e o seu crescente engajamento político foram-se tornando cada vez mais evidentes. Sob o pseudónimo de Johannes Barbarus, que significa "bárbaro" – um nome escolhido talvez para sublinhar a sua rejeição às convenções e ao que ele considerava a "civilização" burguesa –, Vares floresceu como um poeta reconhecido. Paralelamente, as suas inclinações para o socialismo radical aprofundaram-se, moldando a sua visão do futuro para a Estónia.
O Papel na Anexação Soviética de 1940
O verão de 1940 marcou um ponto de viragem trágico para a Estónia e para a vida de Vares. Na sequência do Pacto Molotov-Ribbentrop de 1939, que selou o destino dos Estados Bálticos, as tropas soviéticas ocuparam a Estónia em junho de 1940. Andrei Zhdanov, um emissário soviético enviado para supervisionar a anexação, exerceu pressão sobre o então presidente estoniano, Konstantin Päts, para nomear Vares como primeiro-ministro de um governo provisório. Este governo era, na realidade, uma administração fantoche dominada pelos comunistas e concebida para legitimar a subsequente incorporação na União Soviética.
Em julho do mesmo ano, após a renúncia de Päts sob coerção, Vares assumiu a maioria das funções presidenciais, utilizando o título de "Primeiro-Ministro em funções do Presidente". Este artifício constitucional foi crucial para conferir uma aparência de legalidade às etapas finais da anexação. A culminação deste processo deu-se a 6 de agosto, quando Vares chefiou a delegação estoniana a Moscovo, solicitando formalmente às autoridades soviéticas a incorporação da Estónia na União Soviética. Para muitos estonianos, este ato manchou para sempre a sua reputação, tornando-o uma figura sinónimo de traição à soberania nacional.
Com a anexação consumada, Vares permaneceu como chefe de Estado nominal, embora sem poder real, como Presidente do Soviete Supremo da República Socialista Soviética da Estónia. A sua adesão ao Comité Central do reestruturado Partido Comunista da Estónia (bolchevique) em 12 de setembro de 1940 cimentou ainda mais o seu alinhamento com o regime soviético.
Exílio e Retorno
A invasão alemã da União Soviética em 1941 levou à ocupação da Estónia pelas forças nazis. Neste contexto, Johannes Vares fugiu para a Rússia, vivendo no exílio entre 1941 e 1944, até que os soviéticos reconquistaram o território estoniano. Durante a ocupação alemã, a resistência estoniana, tanto política como militar, procurou manter viva a chama da independência.
Em 20 de abril de 1944, um grupo de proeminentes figuras estonianas reuniu-se clandestinamente em Tallinn. Este Comité Eleitoral da República da Estónia – a instituição constitucionalmente designada para eleger um Presidente Interino – contava com a presença de personalidades como Jüri Uluots, o último primeiro-ministro da Estónia antes da ocupação soviética; Johan Holberg, substituto do comandante-em-chefe das Forças Armadas; Otto Pukk, presidente da Câmara dos Deputados; Alfred Maurer, segundo vice-presidente adjunto do Conselho Nacional; e o juiz estatal Mihkel Klaassen. O Comité declarou a nomeação de Vares por Päts como primeiro-ministro como ilegal e, consequentemente, considerou que Uluots havia assumido as funções de presidente a partir de 21 de junho de 1940. Esta declaração sublinhava a continuidade jurídica da República da Estónia e rejeitava a legitimidade do governo de Vares e do subsequente "Riigikogu do Povo", um parlamento artificialmente criado pelas autoridades soviéticas através de eleições amplamente consideradas fraudulentas em 14 e 15 de julho de 1940. Foi este "Riigikogu do Povo" que declarou a Estónia uma república soviética e "solicitou" a sua adesão à União Soviética, num processo que violava flagrantemente a Constituição estoniana de 1938, que exigia que todas as leis fossem aprovadas em ambas as câmaras antes de serem promulgadas.
Os Últimos Dias
Após o seu regresso à Estónia com as forças soviéticas em 1944, Vares foi, ironicamente, alvo de investigação pelo NKVD (Comissariado do Povo para Assuntos Internos), a polícia secreta soviética, devido às suas atividades durante a Guerra da Independência da Estónia. A pressão e as circunstâncias desta investigação são apenas uma parte do mistério que rodeia os seus últimos dias. Em novembro de 1946, Johannes Vares Barbarus tirou a própria vida no Palácio Presidencial em Tallinn, um fim trágico para uma figura que encarnou as profundas e dolorosas contradições da história estoniana.
FAQs – Perguntas Frequentes sobre Johannes Vares Barbarus
- Quem foi Johannes Vares Barbarus?
- Johannes Vares Barbarus foi um poeta, médico e político estoniano. Embora inicialmente reconhecido pela sua obra literária e serviço militar na Guerra de Libertação da Estónia, tornou-se uma figura controversa devido ao seu papel como primeiro-ministro de um governo fantoche soviético durante a anexação da Estónia pela União Soviética em 1940.
- Por que ele é uma figura tão controversa na história estoniana?
- A sua controvérsia advém do seu papel central na anexação da Estónia pela União Soviética em 1940. Como primeiro-ministro nomeado sob pressão soviética e líder da delegação que pediu a incorporação da Estónia na URSS, é considerado por muitos estonianos como um traidor da soberania nacional.
- Qual foi a sua ligação à ocupação soviética da Estónia em 1940?
- Após a ocupação soviética de junho de 1940, Vares foi forçado a aceitar o cargo de primeiro-ministro de um governo comunista, atuando como "Primeiro-Ministro em funções do Presidente" para dar uma falsa legitimidade à anexação. Ele liderou a delegação que "solicitou" a incorporação da Estónia na União Soviética.
- O que foi a "Cruz da Liberdade" e por que Vares a recusou?
- A Cruz da Liberdade era a mais alta condecoração militar da Estónia, concedida por bravura e mérito durante a Guerra de Libertação. Vares recusou-a, possivelmente devido às suas crescentes convicções socialistas radicais, que o levavam a rejeitar os símbolos e instituições do Estado estoniano independente.
- Como o governo estoniano legítimo via as ações de Vares?
- O Comité Eleitoral da República da Estónia, uma instituição constitucional que representava a continuidade legal do Estado estoniano, declarou a nomeação de Vares como ilegal em 1944. Considerou que as ações do seu governo eram inválidas e que a soberania estoniana nunca foi legalmente cedida, mantendo Jüri Uluots como o legítimo chefe de Estado em funções.
- O que foi o "Riigikogu do Povo"?
- O "Riigikogu do Povo" foi um parlamento criado após eleições fraudulentas orquestradas pelos soviéticos em julho de 1940. Este corpo não representativo declarou a Estónia uma república soviética e "pediu" a sua adesão à União Soviética, num processo que violava a constituição estoniana de 1938.
- O que lhe aconteceu após a reconquista soviética da Estónia em 1944?
- Após regressar à Estónia, Vares foi investigado pelo NKVD soviético, a polícia secreta, pelas suas atividades anteriores à ocupação soviética. Sob estas circunstâncias, ele cometeu suicídio no Palácio Presidencial em Tallinn em novembro de 1946.

English
español
français
português
русский
العربية
简体中文 