O período entre 1894 e 1898 marcou uma fase singular e controversa na história do Havaí: a existência da República do Havaí. Embora de curta duração, este foi um estado unipartidário que emergiu de um período de intensa agitação política, pavimentando o caminho para a sua eventual integração nos Estados Unidos. Sua fundação, em 4 de julho de 1894, simbolizou o fim do Governo Provisório do Havaí, um regime que havia se estabelecido após a dramática derrubada da monarquia. O destino da República foi selado em 12 de agosto de 1898, quando foi anexada pelos Estados Unidos, transformando-se num território incorporado e organizado da nação americana.

A gênese da República remonta a 1893, um ano de profunda crise para a soberania havaiana. Foi nesse ano que o Comitê de Segurança Pública, um grupo composto majoritariamente por empresários e proprietários de plantações, muitos deles descendentes de missionários americanos com poderosos interesses econômicos e laços com os Estados Unidos, orquestrou a derrubada da Rainha Lili'uokalani. A rainha havia tentado restaurar a autoridade da monarquia e promulgar uma nova constituição que revogaria a impopular Constituição da Baioneta de 1887. Esta constituição anterior, imposta ao seu irmão, o Rei Kalākaua, havia drasticamente limitado o poder do monarca, despojado muitos cidadãos havaianos de seus direitos de voto e concedido poder significativo aos cidadãos não-havaianos, especialmente aos interesses econômicos americanos. A recusa da rainha em aceitar esta constituição desigual foi o catalisador final para o golpe.

Inicialmente, o Comitê de Segurança Pública tinha como objetivo primordial a anexação imediata do Havaí pelos Estados Unidos. Contudo, os seus planos esbarraram na política da época em Washington, D.C. O Presidente Grover Cleveland, um democrata com uma forte convicção anti-imperialista, opôs-se veementemente à anexação, considerando-a um ato ilegítimo e contra os princípios da autodeterminação. Esta recusa inicial forçou os líderes do golpe a uma reavaliação. Uma nova constituição foi então redigida, estabelecendo formalmente a República do Havaí enquanto se aguardava um momento mais propício e uma mudança na liderança política dos Estados Unidos para finalmente concretizar o desejo de anexação.

A Liderança da República e o Caminho para a Anexação

Os principais arquitetos e líderes da República do Havaí, figuras como Sanford B. Dole e Lorrin A. Thurston, eram descendentes de colonos americanos. Apesar de terem nascido e crescido no Havaí, e muitos deles dominarem a língua havaiana, seus laços financeiros, políticos e familiares com os Estados Unidos eram inegavelmente profundos. Eles representavam uma oligarquia cujos interesses estavam intrinsecamente ligados à indústria açucareira e ao comércio com os EUA, vendo na anexação a garantia de estabilidade econômica e proteção política contra outras potências coloniais. A sua visão para a República não era a de um estado soberano a longo prazo, mas sim a de uma fase de transição que culminaria na sua incorporação como um território dos Estados Unidos.

Sanford B. Dole, uma figura central neste período, havia servido anteriormente como membro da Legislatura Real de Koloa, Kauai, e como Juiz da Suprema Corte do Reino do Havaí, demonstrando sua profunda familiaridade com a estrutura legal e política das ilhas. Após a derrubada da monarquia, Dole assumiu a presidência do Governo Provisório e, posteriormente, da República. Ele encarregou Lorrin A. Thurston – que já havia atuado como Ministro do Interior do Rei Kalākaua e era um ardente defensor da anexação – de liderar um intenso esforço de lobby em Washington, D.C. O objetivo era assegurar a anexação do Havaí pelos Estados Unidos, navegando pelas complexas correntes políticas americanas.

No cenário político dos Estados Unidos, a questão do imperialismo ultramarino era notoriamente controversa. Muitos americanos, conscientes das origens coloniais de sua própria nação, hesitavam em embarcar em empreendimentos coloniais. Contudo, a eclosão da Guerra Hispano-Americana em 1898 alterou drasticamente essa dinâmica. A necessidade estratégica de uma base naval no Pacífico para apoiar as operações militares, especialmente nas Filipinas, sublinhou a importância geopolítica do Havaí. Essa mudança de percepção, aliada a uma administração republicana mais favorável à expansão, liderada pelo Presidente William McKinley, abriu as portas para a anexação. Assim, em 12 de agosto de 1898, em meio ao fervor da guerra, o Havaí foi formalmente anexado pelos Estados Unidos. Dois anos depois, em 14 de junho de 1900, o Território do Havaí foi oficialmente estabelecido como uma parte integrante dos EUA, encerrando a breve existência da República.

O Relatório Blount e a Cumplicidade Americana

A legitimidade da derrubada da monarquia havaiana e a subsequente anexação sempre foram pontos de contencioso. Uma das investigações mais significativas sobre esses eventos foi conduzida pelo Comissário Especial James H. Blount, enviado ao Havaí pelo Presidente Grover Cleveland em 1893. O resultado dessa investigação foi o Relatório Blount, um documento que "forneceu as primeiras evidências que identificavam oficialmente a cumplicidade dos Estados Unidos na derrubada ilegal do governo legal e pacífico do Havaí".

Desde o momento do golpe, as autoridades americanas agiram com uma rapidez questionável. O Ministro dos EUA no Havaí na época, John L. Stevens, reconheceu imediatamente o novo governo provisório, e, crucialmente, fuzileiros navais dos EUA foram desembarcados de um navio de guerra ancorado na baía de Honolulu. Embora a justificativa oficial fosse a proteção de vidas e propriedades americanas, os partidários da Rainha Lili'uokalani e muitos observadores da época acusaram a presença ostensiva desses fuzileiros navais de ter intimidado a rainha e desmoralizado seus apoiadores, facilitando assim o sucesso da revolução.

As conclusões do Relatório Blount foram inequívocas e incisivas. Blount determinou que os Estados Unidos haviam se envolvido em atividades partidárias não autorizadas, incluindo o desembarque de fuzileiros navais sob um pretexto falso ou exagerado, tudo para apoiar os conspiradores antimonarquistas. Ele afirmou que essas ações foram absolutamente fundamentais para o sucesso da revolução e, mais grave ainda, que a revolução havia sido realizada contra a vontade da maioria da população havaiana. Embora as recomendações de Blount para restaurar a monarquia não tenham sido plenamente implementadas devido à complexidade política e à resistência dos golpistas, o relatório permanece como um testemunho histórico da intervenção estrangeira e da injustiça percebida no processo de transição do Havaí.

Sanford Ballard Dole: Uma Figura Central na Transição Havaiana

Entre as personalidades mais proeminentes e controversas que moldaram o destino do Havaí durante o final do século XIX, destaca-se Sanford Ballard Dole (1844-1926). Advogado e jurista de formação, Dole personificou a complexa interseção de lealdades e ideologias que caracterizaram as ilhas nesse período. Sua vida abrangeu e influenciou diretamente as diversas fases da história havaiana, desde o apogeu do Reino, passando por um breve período como protetorado, a eclosão da República, até a sua consolidação como Território dos Estados Unidos.

Descendente de uma proeminente comunidade missionária americana estabelecida no Havaí, Dole cresceu imerso tanto na cultura havaiana quanto na americana, o que o dotou de um profundo conhecimento das realidades locais, incluindo a fluência na língua havaiana. Contudo, suas convicções estavam firmemente alinhadas com a ocidentalização do governo e da cultura havaianas, acreditando que a modernização e a integração com os Estados Unidos seriam benéficas para o arquipélago.

Após a derrubada da monarquia da Rainha Lili'uokalani em 1893, Dole emergiu como a figura política de maior destaque entre os conspiradores. Ele assumiu a liderança do Governo Provisório e, posteriormente, presidiu a República do Havaí, desempenhando um papel decisivo na transição das ilhas para o domínio americano. Foi sob sua liderança que o governo da República trabalhou incansavelmente para garantir e finalmente concretizar a anexação do Havaí pelos Estados Unidos, uma meta que ele e seus aliados haviam buscado por anos. Sua trajetória é um exemplo vívido das forças políticas, econômicas e culturais que culminaram na perda da soberania do Reino do Havaí.

Perguntas Frequentes sobre a República do Havaí

O que foi a Constituição da Baioneta de 1887?

A Constituição da Baioneta foi um documento imposto ao Rei Kalākaua do Havaí por um grupo de militantes não-havaianos, majoritariamente americanos, que ameaçaram o monarca com violência. Ela limitou severamente o poder do rei, despojou muitos cidadãos havaianos de seus direitos de voto e concedeu poder político e de voto significativo aos residentes estrangeiros, especialmente aqueles com interesses comerciais e de propriedade.

Por que a Rainha Lili'uokalani foi derrubada?

A Rainha Lili'uokalani foi derrubada em 1893 por um grupo de americanos e europeus residentes no Havaí, conhecido como Comitê de Segurança Pública, que buscava a anexação do Havaí pelos Estados Unidos. O catalisador imediato para o golpe foi a tentativa da rainha de promulgar uma nova constituição que restauraria o poder da monarquia e os direitos de voto dos cidadãos havaianos, revogando a impopular Constituição da Baioneta.

Por que os Estados Unidos inicialmente se recusaram a anexar o Havaí?

Inicialmente, o Presidente dos EUA, Grover Cleveland, um democrata com fortes convicções anti-imperialistas, opôs-se à anexação do Havaí. Ele considerou a derrubada da monarquia um ato ilegal no qual os diplomatas e militares americanos estiveram envolvidos, e acreditava que a anexação seria uma violação dos princípios de autodeterminação e da soberania havaiana.

Qual o papel dos militares dos EUA na derrubada da monarquia?

Embora os militares dos EUA não tenham ativamente disparado tiros, a presença de fuzileiros navais americanos, desembarcados do navio USS Boston a pedido do Ministro dos EUA John L. Stevens, é considerada crucial. Essa presença intimidou a rainha e seus apoiadores e desmoralizou as forças leais à monarquia, contribuindo para o sucesso do golpe sem um confronto armado significativo, conforme documentado pelo Relatório Blount.

Como a Guerra Hispano-Americana influenciou a anexação do Havaí?

A eclosão da Guerra Hispano-Americana em 1898 mudou drasticamente a percepção estratégica do Havaí. A necessidade de bases navais e pontos de abastecimento no Pacífico para apoiar as operações dos EUA contra a Espanha nas Filipinas e em outras regiões do Pacífico destacou a importância geopolítica do arquipélago. Isso gerou um apoio renovado à anexação no Congresso dos EUA e na administração do Presidente William McKinley.

O que foi o Relatório Blount?

O Relatório Blount foi o resultado de uma investigação conduzida em 1893 pelo Comissário Especial James H. Blount, enviado pelo Presidente Grover Cleveland para investigar a derrubada da monarquia havaiana. O relatório concluiu que os diplomatas e militares dos EUA haviam agido de forma ilegal e partidária para apoiar os conspiradores, e que a revolução havia sido realizada contra a vontade da maioria da população havaiana.

Quem foi Sanford B. Dole?

Sanford B. Dole foi um proeminente advogado e jurista havaiano, descendente de missionários americanos. Ele desempenhou um papel central na derrubada da monarquia havaiana, servindo como presidente do Governo Provisório e depois da República do Havaí. Ele era um forte defensor da ocidentalização e da anexação do Havaí pelos Estados Unidos.

O que aconteceu com a monarquia havaiana após a derrubada?

Após a derrubada em 1893, a Rainha Lili'uokalani foi brevemente aprisionada e mais tarde libertada. Ela passou o resto de sua vida tentando restaurar a soberania do Havaí e apelando ao governo dos EUA, mas sem sucesso. A monarquia foi oficialmente abolida e nunca foi restaurada. Seus bens foram eventualmente confiscados pelo governo da República.